sexta-feira, 9 de outubro de 2009

O Ilusionista

O Ilusionista



Branca Moura Machado



Não deixa de ser uma ironia um filme cujo tema é a ilusão. Que conta a história de um profissional que vive de dar um show em que ilude a platéia. Ora, não é isso também que faz o cinema? “Engana” os que querem ser enganados com um tratamento técnico das imagens? Truques para os olhos, ilusões de ótica, tramóias mecânicas, habilidades artísticas, “O ilusionista” trata destes temas ao mostrar a história de um homem, Eisenheim (Edward Norton), que ganha a vida dando shows de mágica, mas que, como qualquer outro, também ama uma mulher, Sophie (Jessica Biel). Ocorre que Sophie é a noiva do príncipe Leopold (Rufus Sewell). Um sujeito totalmente cético e racional e que, por isso, logo de imediato, implica com o mágico. Temos então, além do conflito amoroso, uma disputa entre o real e o que se faz real. Em um certo momento do filme, o príncipe pergunta à noiva: “Ele tenta enganá-la. Eu tento iluminá-la. Qual o melhor?”. Trata-se da batalha da razão contra a ilusão, do monarca contra o mágico e entre eles, um amor de juventude.

A cena que sintetiza esta batalha com maestria é aquela na qual o príncipe desafia o ilusionista, incitando-o a fazer sua apresentação sem nenhum artifício: “Quero seu show sem bugigangas!”. Mas, na verdade, através do truque apresentado, o desafio volta-se contra o príncipe. Eisenheim usa a própria espada de Leopold bem como a lenda de Excalibur para desafiar a honra do príncipe herdeiro. A tensão neste momento é latente. E ficamos aflitos como aquela platéia deve estar. O mágico provocou e criou um rival. E a trama por trás da trama do filme começa a ser desenhada.

A partir dali, o príncipe delega a um inspetor de polícia Uhl (Paul Giamatti) a missão de desmascarar a verdade por trás do trabalho do mágico. Eisenheim chega a ser preso por fraude. Mas qual é a fraude se ele se auto intitula “o ilusionista?” Em filmes tão diferentes como este e “Na captura dos Friedmans”, este tema é polêmico e relevante. Até onde a polícia pode forçar os fatos? Há uma diferença grande entre o que a polícia quer que seja e o que realmente é. Neste filme, ela prende um mágico (!) por fraude. No outro que, por ser um documentário, sua atitude ainda é mais grave, ela praticamente força os depoimentos de crianças para conseguir as provas de uma acusação. Os fatos, nestes momentos, são irrelevantes, num verdadeiro uso da máxima de Maquiavel “O príncipe não hesitará em recorrer ao crime se for necessário”. Mesmo numa ficção, na qual a premissa principal não trata do assunto, incomodou-me o uso da polícia para satisfazer a um interesse particular.

As pessoas ávidas por explicações talvez não gostem da falta de esclarecimento sobre os truques, mas não acho que, no filme, isso seja necessário Não sei bem se o verbo é enganar, uma ilusão pode ser criativa, pode abrir sua mente e pode iluminar bem mais que uma verdade cruel. No “Ilusionista”, o truque vem mesmo como uma salvação.

O cinema, como o mágico, também nos dá o prazer do deslumbramento. O maior truque do cinema é juntar arte, entretenimento, história e crítica social em um discurso imagético. No filme, “o maior truque do mágico traz uma grande contribuição para a sociedade”. O maior truque do cinema também.

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