sexta-feira, 3 de julho de 2020

Entre Facas e Segredos


O grande mistério que permeia Entre Facas e segredos é: “Harlan Thrombey (Christopher Plummer) se matou ou foi assassinado?”. A princípio, a polícia nem questiona e classifica a morte como suicídio. Mas surge em cena o detetive particular Benoit Blanc (Daniel Craig), que é contratado por um cliente anônimo para questionar esta primeira versão. O detetive possui uma grande fama, teve seu perfil publicado no The New Yorker, e é um típico personagem do gênero como Poirot ou Holmes, que presta atenção a tudo, valoriza detalhes que podem parecer insignificantes e possuem um certo ar blasé. Interessante notar que Daniel Craig, conhecido como o protagonista de 007, deixa o espião cheio de armas sofisticadas para usar uma estratégia puramente mental. Conforme esclarece o detetive: "Eu observo os fatos sem me deixar levar pela emoção ou razão. Eu determino a trajetória, percorro tranquilamente até o final e a verdade cai aos meus pés.". 
Então, o que assistimos a partir da morte de Harlan é a trajetória de Blanc, em conjunto com a polícia, para descobrir os segredos por trás daquela morte, além da verdade aparente. 
Em um primeiro momento, na própria mansão de Harlan, os investigadores interrogam um a um os presentes na festa de 85 anos da vítima, ocorrida na noite de sua morte. Com isso, conhecemos os personagens, estabelecemos a sua relação com o morto, e vemos, ao mesmo tempo, o que eles contam para a polícia e o que de fato aconteceu na cena que é mostrada em tela. Todos têm segredos. E, conforme Harlan afirma a cada um em particular na noite investigada: “Tomei minha decisão”.  E esta decisão não foi benéfica para nenhum dos envolvidos; todos, de alguma forma, dependentes do patriarca morto.
Harlan era um escritor de mistérios famoso e muito rico. Com uma fortuna estimada em U$ 60 milhões, além da mansão e dos direitos autorais, qualquer um dos herdeiros que visse sua herança ameaçada, teria motivo para matá-lo antes disso. São interrogados Linda (Jamie Lee Curtis), filha de Harlan; seu marido Richard (Don Johnson) e seu filho Ransom (Chris Evans);  Walt (Michael Shannon),  filho caçula do escritor; Joni (Toni Colette), nora de Harlan e sua filha Megan (Katherine Langford). Além dos familiares, a casa ainda tinha uma governanta, Fran (Edi Patterson) e  Marta Cabrera (Ana de Armas), a enfermeira particular do anfitrião. 
Como um bom suspense, o filme tem suas viradas e nada é o que parece. Entremeado por um humor sutil e ácido, é um prazer assisti-lo. Os ambientes e a caracterização dos personagens nos lembram o jogo de tabuleiro "O Detetive”. As cenas são bem construídas e, muitas vezes, vemos Blanc e um certo personagem da trama em uma metade da tela, enquanto a família está na outra metade. Existem dois lados ali, mesmo que ainda não se saiba.
E, ao final, o arco se completa ao observamos o mesmo personagem na varanda da casa, enquanto o restante da família está do lado externo, olhando para ele. O confronto está lá novamente. Mas, desta vez,  a família está fora. Na caneca que o personagem segura está escrito: “Minha casa, minhas regras, meu café. ”. Sem dizer mais nada, o desfecho está traçado.