terça-feira, 10 de agosto de 2010

Tudo Pode Dar Certo

Branca Machado – 10/08/2010



Com título original “Whatever Works”, o filme “Tudo pode dar certo” teria melhor tradução se seu título fosse “O que funcionar.” Ou ainda, “O que der certo, ótimo”. Boris Yellnikoff (Larry David), o protagonista, um sujeito mal-humorado, cético, super sincero e cuja “prioridade nunca foi o charme” acaba nos dando uma lição de vida, ao nos dizer para deixar as coisas acontecerem. Em seu monólogo inicial, ele quebra a quarta parede e se dirige diretamente a nós, aconselhando: “Chega de “poderia ter" ou "deveria ter", contente-se com o que der certo”.

A partir daí, acompanharemos a trajetória do personagem, que, apesar de ter tentado o suicídio duas vezes (“obviamente, não funcionou”), nos explicará por que “se dá ao trabalho de viver”.O filme retrocede ao seu primeiro casamento. Para ele, a união não deu certo por que tudo se encaixava, combinava demais. E ele conclui para então esposa : “Na teoria, somos o ideal. Mas a vida não é o ideal.”

Boris é um físico nuclear aposentado que quase foi indicado ao Prêmio Nobel. Considera-se um gênio. Depois da separação, ele passou a dar aulas de xadrez para crianças e, ao ser questionado por uma mãe do motivo pelo qual ele havia jogado um tabuleiro de xadrez em seu filho, ele simplesmente responde: “Porque seu filho é um imbecil”. Ela rebate: “Meu filho é brilhante!” Ele conclui: “Na sua opinião”. Este é Boris. Um gênio que não faz a menor questão de agradar.

Depois de sermos apresentados apropriadamente ao personagem, conhecemos Melody Celestine (Evan Rachel Wood), uma jovem que, vinda do sul, encontra o protagonista na porta de seu apartamento em Chinatown e, após um breve diálogo, pede para morar com ele. Melody é inocente, doce e simplesmente considera todas as teorias de Boris grandes verdades, apesar de não entendê-las completamente. Ela pergunta: “Em que você é gênio?” Ele responde: “Em mecânica quântica”. E ela: “Tá. Mas em que campo? Filmes?” Ela também repete coisas do tipo: “Devia ter pena capital para aqueles que chamam mãe de mamãe e para os que não recolhem fezes de cachorro nas ruas”.

Trata-se de um casal inusitado. Sobre Melody, Boris reflete: “O que posso oferecer? Mau humor, pânico e misantropia? É tão absurdo que não dá para pensar! É tudo contra” Em uma perfeita rima com o diálogo que teve com a primeira esposa no qual dizia que o problema deles é que era tudo a favor. Ele acaba por concluir que o fator casualidade na vida é impressionante. E cede aos encantos de Melody. Um ano de casado e não foi o pior ano da vida dele...

Como nos principais filmes de Woody Allen, o grande trunfo de “Tudo pode dar Certo” são os diálogos inteligentes, as teses inusitadas, a síntese; a forma como ele faz graça com a vida e diz grandes verdades de forma leve e eficiente. O personagem principal é um suicida, mal humorado e manco e saímos do filme mais leves do que entramos! Está aí, novamente, o improvável. Boris, ao final, comenta: “Há pessoas lá fora nos assistindo. Não sei quantos restaram.” Estão todos lá, Woody.