terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Elis



                                                                                                                                                Branca Moura Machado

Quando Elis Regina morreu, eu era bem nova. Não acompanhei seu sucesso, mas me lembro de que foi a primeira vez que vi minha mãe chorar. Aos poucos, fui percebendo a importância da cantora para a música popular brasileira e sei cantar muitas de suas músicas; também por influência dos meus pais. Assim, não é à toa que o filme começa com a interpretação de Elis (Andréia Horta) da música “Como nossos pais”. Vemos a atriz de perfil, braços, bocas, e olhos bem abertos; gestos e expressões que marcaram a cantora. Como a cantora afirmou a Ronaldo Bôscoli (Gustavo Machado): “Essa sua Bossa Nova, esse negócio de cantar para dentro, para depois sair um fiapo de voz - não é comigo não. Eu canto para fora!”.
Acompanhamos a chegada de Elis ao Rio em abril de 1964 junto com seu pai para gravar um disco para o qual foi convidada, quando ainda cantava em Porto Alegre. Elis cantava desde os 13 anos e adorava o que fazia. Seu pai  trabalhava como empresário e ela praticamente sustentava a família com seu canto. No Rio, a cantora não chegou a gravar o disco, mas começou a cantar na boate Monsieur Pujol, cujo proprietário era Miéle (Lucio Mauro Filho) e não parou mais. Foi lá também que ela conheceu Bôscoli, jornalista, produtor musical e sócio de Miéle. A dinâmica da relação entre eles dita o ritmo da primeira parte do filme. Bôscoli era namorado da Nara Leão, da Maysa, da corista; enfim do Rio de Janeiro todo... Mas, a princípio, não se deu bem com Elis. Ao conhecê-la, desdenhou seu talento para, depois, render-se a ele. Do mesmo modo, ela não gostou daquele homem arrogante, mas acabou cedendo a seu charme. Foi ele que ensinou a Elis que a emoção da cantora tem que estar a serviço da intenção da letra. A relação entre os dois foi intensa e, de muitas formas, fez Elis amadurecer e marcou toda a sua trajetória. Esta cantora madura e atormentada toma conta da segunda fase do longa.
As interpretações de Elis durante o filme descrevem os momentos de sua vida. Como quando ela se separa de Bôscoli e a assistimos interpretar “Atrás da porta”. Percebemos na cantora uma alma naturalmente inquieta e que só piorou ao ter contato com álcool e drogas. Andréia Horta interpreta de forma brilhante essa mulher de personalidade forte, sorriso fácil, enorme sensibilidade e voz inigualável; mas que criou um círculo paranoico que não foi capaz de quebrar. Conforme seu segundo marido, César Camargo Mariano (Caco Ciocler), resumiu: “Seu problema é que você não sabe o que você quer.”. O primeiro teste que Elis fez no Rio foi para protagonista da peça “Pobre menina rica”. E, de certa forma, foi isso que ela se tornou. O filme retrata a evolução do talento e da tensão dessa cantora que se cansou de ter que ser perfeita; mas que também não deu conta de não ser... Quanto a nós, fica o pesar de perdê-la tão precocemente.