terça-feira, 24 de novembro de 2015

Homem Irracional



Branca Machado, 23/11/2015


      Em “Homem Irracional”, Woody Allen conta a história de Abe Lucas (Joaquin Phoenix), professor de filosofia, especializado em Kant, que começa a dar aulas em Newport. No filme, o diretor retoma temas caros a ele como filosofia x realidade, o acaso, crimes e a obra de Dostoiévski. 

      O professor está completamente frustrado. Não há melhor maneira de descrever seu estado de espírito que sua própria descrição: “O orgasmo já não curava a minha angústia. É muito sombrio quando acabam as distrações...”. O protagonista é um homem desmotivado, que bebe todo o tempo e não se empolga com nada. Está sempre apoiando a mão no queixo e possui aquela barriga de quem não se importa.

     Apesar de seu estado de espírito e, até mesmo por causa dele, o professor provoca uma espécie de fascinação em sua aluna Jill (Emma Stone): “Abe é autodestrutivo, mas brilhante...”.E conclui: “Eu gosto de ficar perto de uma pessoa tão problemática...”. Quando ela leva o professor a uma festa, ele se arrisca na roleta russa, jogo que ele compara ao acaso. Atira duas vezes e explica: “50% é uma chance muito maior que muita gente tem na vida.”. Os alunos o criticam e ele diz: “Esta foi uma aula de existencialismo melhor que qualquer outra.”. A sensação de puxar o gatilho no jogo de azar parece ser a emoção que Abe procura em sua vida.
      Um dia, sentado em um restaurante com Jill, ele ouve uma conversa que o faz respirar novamente. A partir dela, o professor volta a ser criativo, inspirado e, por que não, conquistador? É interessante observar a mudança em seu estado de espírito.No início do filme, Rita (Parker Posey), uma colega de trabalho, leva-o para a praia e ele se senta de costas para o mar; já, com a aluna, depois da mudança, ele finalmente admira a paisagem. E assim ele resume sua virada: “Tem que romper com a razão familiar para ver a vida de verdade. O risco fazia com que me sentisse vivo. ”
      Não por acaso, o professor é famoso por um artigo que escreveu sobre ética situacional, aquela que sustenta que a moralidade de um ato é determinada por seu contexto. Se há um certo e errado, ele é simplesmente definido pelo resultado desejado da situação. Ao longo do filme, compreende-se o apreço de Abe ao tema. A cena na sala de espelhos do parque de diversões é simbólica. Vemos o beijo entre Jill e Abe refletido no espelho. O beijo deformado. Como deformada é a visão que Jill tem de Abe; e a visão que Abe tem sobre a vida.