quinta-feira, 31 de agosto de 2017

O Estranho que nós amamos

Na cena inicial de “O estranho que nós amávamos” uma menina cantarola pelo bosque enquanto colhe cogumelos. Estamos no estado de Virgínia, em 1864, plena Guerra Civil. Amy (Oona Laurence) encontra um soldado Yankee (Colin Farrell) e, portanto, inimigo, ferido no bosque. Ela resolve levá-lo até a escola de moças Farsnworth; onde, além dela, vivem a proprietária, a professora e mais 04 alunas; as que ficaram, pois não tinham para onde ir. Com a guerra, os escravos que trabalhavam no local fugiram.
Dirigido por Sofia Coppola, o filme é daqueles no qual cada cena parece um quadro e poderia ser emoldurada e pendurada numa parede. Com a produção, Sofia tornou-se a segunda mulher a vencer, como diretora, o Festival de Cannes. Como toda a trama se passa na escola, e com poucas personagens, o longa assume uma atmosfera teatral que combina muito bem com esse suspense psicológico que, por vezes, sofre reviravoltas.
Para entrar na casa, todas as mulheres ajudam a carregar o soldado. A cena assumirá uma carga bastante significativa ao longo da projeção. Elas decidem tratar de sua ferida até que ele se recupere e, então, avisarão ao exército sulista para que ele possa ser preso. Quanto a isso, ele comenta com Martha Farnsworth (Nicole Kidman): “Sou grato por ser seu prisioneiro”. Quando Amy diz que o nome do soldado é John Mcburne para as outras alunas, Martha é categórica: “Ele não ficará aqui tempo suficiente para seu nome fazer diferença."
Quando Martha percebe que Edwina (Kirsten Dunst) está usando um broche que não usava há tempos comenta: “Parece que a presença do soldado está nos afetando. ”. E ele sabe disso: “Acho que estou perturbando sua rotina”. Martha afirma: “Sim, está”. Cada uma das moradoras daquela casa tem uma reação diferente ao estranho e ele sabe como tratá-las de acordo as reações que provoca. Por isso, acaba ficando mais tempo que o planejado. Ele corteja Edwina. Conversa de forma respeitosa e quase submissa com Martha. Aceita ser seduzido por Alícia (Elle Fanning). É amigo de Amy. E por aí vai.
Pode-se dizer que a cena em que John finalmente é convidado a jantar à mesa com as mulheres é a virada da trama. O jantar é repleto de risadinhas e olhares, estão todas muito bonitas. Alicia é elogiada por ter feito a torta de limão, mas Edwina esclarece que a receita é dela. Na mesa, há uma concorrência subjacente e, ao ter que lidar com todas ao mesmo tempo, John perde o tom.
É neste tipo de desequilíbrio que a história vai se complicar. Em determinado momento, Martha comenta com o soldado que ser corajosa é fazer o que é necessário em cada situação. Pode-se, então, dizer, que ela foi corajosa por todo o filme. Sem pestanejar em fazer o necessário. Quanto a John, acabou sendo enredado numa teia que, a princípio, subestimou. A cena de sua chegada rima perfeitamente com a de sua saída. E, para nós, pode ser surpreendente, mas faz sentido para aquela pequena comunidade que passamos a conhecer.