quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Carol

Branca Machado – 22/01/2016

       
No início de “Carol”, acompanhamos um homem que entra em um hotel e vai até o bar. Lá, ele avista Therese (Rooney Mara) que está sentada à mesa com Carol (Cate Blanchet) e segue para cumprimentá-la. Temos a sensação de que ele interrompe uma conversa importante. Mas não sabemos do que se trata. Ele pergunta se Therese comparecerá a uma festa naquela noite, Carol aproveita a oportunidade para deixar a mesa, coloca a mão no ombro da outra, que reage significativamente ao gesto, e diz: “Tenha uma noite maravilhosa.”.
        Ao entrar no carro, Therese olha pela janela e começa a relembrar os acontecimentos desde que conheceu Carol na loja onde trabalhava.Carol chamou a atenção dela quando apareceu em busca de um presente para a filha. Uma mulher moderna, elegante, colorida; alguém que, talvez, a vendedora gostaria de ser ou pudesse se tornar.
        Baseado no livro "The Price of Salt" de Patricia Highsmith de 1952 e dirigido por Todd Haynes, o filme nos conta uma linda história de amor, conturbada pelo terrível preconceito dos anos 50. Se fosse entre um homem e uma mulher, seria apenas linda. Como é entre duas mulheres, é também sofrida. Carol terá que pagar um preço bem alto para assumir seus desejos. E tentará seriamente abafá-los em prol de uma vida “normal” com sua filha. Em um jantar, a anfitriã comenta com Carol: “Ele não gosta que eu fume.” E Carol questiona: “E daí? Você gosta”. Esta pequena afirmação diz tanto sobre ela. Naquela época, não era fácil pensar assim. E ela mesma, algumas vezes, pensa em refutar.
        Em determinado momento, Therese vai ao cinema com o namorado e o irmão mais novo dele. Assistem a Crepúsculo dos deuses. O cunhado está fazendo uma pesquisa entre o que os personagens dizem e o que realmente sentem. O que não deixa de ser bastante pertinente ao próprio filme, no qual há muitos momentos de sentimentos velados a fim de que se encaixem ao que se deseja daquelas mulheres em determinados contextos. A cena em que Carol almoça com a família do ex-marido (Kyle Chandler) retrata bem isso. Enquanto ela passa esta situação bastante conflituosa, Therese desabrocha. De uma pessoa que “não consegue dizer não”, ela ganha personalidade e começa a perseguir seus objetivos. Torna-se mais segura e, por que não, colorida. É gratificante imaginar que, em certo instante, essas duas mulheres em trajetórias diferentes podem encontrar uma interseção.
        Em uma audiência, Carol afirma para o ex-marido: “Não somos pessoas feias, Harge”. Até hoje, em nome da moral, somos capazes de coisas bastantes “feias”. Uma moral que serve para o amor entre um homem e uma mulher mas, se não for entre eles, deixa de servir. E, por isso, o filme é importante. Voltamos a cena do início e acompanhamos o desfecho daquela noite. A cena final é icônica, ao nos permitir vislumbrar vários momentos dali por diante, mesmo sem vê-los.