terça-feira, 2 de outubro de 2018

O Pianista (2003)

Branca Moura Machado

Em minhas férias, tive a oportunidade de rever "O Pianista" no caminho entre Auschwitz e Varsóvia. Nada mais apropriado. O filme nos contextualiza no que acabamos de ver e no que ainda vamos conhecer.  Ao mesmo tempo, assistimos ao longa de outra forma ao conhecer aqueles lugares. Ele se torna mais real, palpável e, principalmente, chocante. O diretor Roman Polanski escapou do Gueto de Varsóvia quando criança, após a morte de sua mãe. E viveu numa fazenda polonesa até o fim da Guerra. Por isso,   realizar esta obra funcionou como uma espécie de catarse para ele.
Assistimos à história real de Wladyslaw Szpilman (Adrien Brody), talentoso  pianista judeu que toca na rádio de Varsóvia  em 1939. Na primeira cena, o pianista toca, quando começa um bombardeio na cidade; que estava sendo invadida pelos nazistas. Ele vai para casa e encontra sua família, preparando as malas para fugir. Szpilmam recusa-se a sair, numa decisão emblemática, já que conseguirá sobreviver na cidade durante todo o conflito.  Quando, à noite,  a família escuta no rádio que a Inglaterra tinha entrado em Guerra com a Alemanha, tranquilizam-se e comentam "A Polônia não está sozinha.". Ocorre que isto era só o começo. E, de certa a forma, a Polônia ficou isolada durante o conflito. Do meio milhão de judeus que viviam em Varsóvia, sobraram 60 mil.  
Durante o filme, assistimos à destruição da cidade, juntamente com a dos judeus ali restantes e  de cidadãos poloneses que resistiram à invasão alemã (é impressionante ver o que a cidade  virou após a Guerra e como ela está hoje. Não à toa, ela é conhecida como a fênix europeia). Na primeira metade do filme, assistimos aos judeus da cidade mudando-se para o gueto e vivendo em condições cada vez piores. Vivenciamos também sua transferência para os campos de concentração em 1942. Primeiro, colocam-nos no gueto; depois constroem um muro e, finalmente, levam-nos para o campo de concentração.  Na segunda metade, assistimos a Spilzman tentando sobreviver escondido nos prédios abandonados da cidade. Há duas cenas representativas destas duas etapas: em uma, o pianista caminha desolado  na direção da câmera numa rua do gueto repleta de corpos no chão, entre os prédios já vazios. Na outra, ele novamente caminha sozinho em direção à câmera, mas, então, não há mais nada, nem corpos, nem prédios; só destruição e cinzas.
A transformação corporal de Adrien Brody é impressionante. Sua decadência física não é acompanhada pela artística, já que podemos notar seus dedos tocarem um piano imaginário durante toda a trama.  O filme segue a trajetória de seu personagem. Quando  sua família é direcionada aos campos de concentração, por exemplo, não mais a acompanhamos; pois ficamos com o protagonista na cidade. Aos trancos e barracos, o pianista judeu sobreviveu dentro de Varsóvia durante todo o período da guerra. Voltou a tocar e viveu até os 88 anos. De certa forma, seu talento o salvou. E não deixa de ser reconfortante  pensar que a música foi capaz de amenizar todo o ódio alimentado no período. Ela falou mais alto - uma linguagem comum em meio a tanta incompreensão.