quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Leões e Cordeiros

Leões e Cordeiros
Branca Moura Machado – 23/11/2007

“Leões e Cordeiros” trata de decisões. Decisões pessoais, decisões que afetam o mundo, decisões jornalísticas, sempre difíceis e, principalmente, relacionadas. Ele parte de vários questionamentos e reflexões sobre a guerra no Iraque. Como, por exemplo, do fato que cerca de 3555 americanos morreram desde o início da guerra. Será que está valendo a pena?

O filme transita entre 03 núcleos associados numa relação de causa e efeito: a entrevista do senador Jasper Irving (Tom Cruise) à Janine Roth (Meryl Streep); a discussão entre o professor Stephen Malley (Robert Redford) e seu aluno Todd (Andrew Garfield) e na nova ação militar de soldados americanos no Afeganistão.

Jasper quer justamente apresentar com exclusividade à Janine a nova estratégia militar americana que “mudará o rumo da guerra”. Eles terão 01 hora para esta entrevista e Janine se surpreende: “01Hora! Isto tudo é pânico?” E Jasper responde: “Não. É determinação”. O senador possui a seguinte citação de Roosevelt em sua sala: “Se eu tiver de escolher entre honradez e paz, escolho a honradez”.Isto nos faz compreender melhor a personalidade dele e sua obstinação em transformar o fracasso contra o terrorismo em vitória.

Dirigido por Robert Redford, “Leões e Cordeiros” se passa praticamente em tempo real como o clássico “Matar ou Morrer”. Esta ação militar que o senador apresenta e justifica com detalhes à Janine está acontecendo ao mesmo tempo em que a entrevista se realiza. A conversa entre o professor e o aluno, que, aliás, também terá duração de 01 hora, acontece concomitantemente às outras duas situações. Assistimos à teoria na entrevista de Jasper, à prática na ação dos militares e à reflexão sobre elas na mudança de comportamento e vontade do aluno questionada pelo professor.

O embate entre a imprensa e a política ali incluído é instigante e necessário. Quais são os limites? Até onde a imprensa deve simplesmente contar os fatos e em que ponto ela deve interpretá-los e tomar uma posição?Janine não tem medo de confrontar Jasper e ele, por outro lado, é capaz de responder a altura. Logo de início, Jasper agradece à Janine sobre uma matéria escrita por ela anos atrás em que a jornalista comentava que ele era o futuro do seu partido (Republicano). O senador comenta o assunto e a agradece pela matéria. Ela então replica: “Considerando a situação do seu partido, como sabe que não foi pejorativo?” Janine, de certa forma, representa a voz do espectador. É sua catarse. Em certo momento, ela pergunta ao senador sobre a nova ação no Afeganistão: “Basicamente, é matar gente para ajudar gente?” Em outro momento, ela rebate: “E sair de lá? Não é uma opção?” Ele responde: “Não. Não é... O povo americano precisa de uma vitória”.

Por outro lado, Jasper também discute o papel da imprensa e o da própria jornalista desde o início da guerra. Ele a enfrenta: “Quando vocês passaram a confundir a opinião da maioria com a opinião correta? No começo, vocês foram a favor da intervenção americana no Iraque!”. Será que a imprensa não está simplesmente acompanhando a opinião pública sem fazer a diferença? Será que ela não está simplesmente se descartando do processo como o aluno Todd, mas numa dimensão muito maior?

A narrativa do filme é circular e recorrente. E é sempre um prazer para o público reconhecer algo que já foi citado anteriormente e fazer a associação pretendida como quando Todd enfrenta Malley: “Você quer que eu seja algo maior? Um congressista?” Neste momento, voltamos à entrevista de Jasper e é como se Todd perguntasse: Você quer que eu me torne um Jasper? Ou ainda, quando Jasper afirma solenemente à Janine que não pretende concorrer à Presidência da República, o que nos remete também a uma observação anterior do aluno ao professor.

A discussão entre Malley e Todd, no fundo, é um recado para todos nós. O professor está ali tentando convencer o aluno a não se alienar, não desistir, não se render ao cinismo. A mensagem do professor é atual e relevante. E a palavra de ordem é engajamento. O professor afirma ao aluno: “Professores não são mestres, são vendedores”. E todd rebate: “E o que você vende?” Malley: “Você a você mesmo. O problema somos nós! Que tentamos manobrar entre as chamas!” O fato é que, se não apagarmos as chamas, vai ficar cada vez mais difícil escapar delas. E todos temos ou, pelo menos deveríamos ter um papel social relevante.

Os soldados Arian (Derek Luke) e Ernest ( Michael Peña) que no momento aparecem em ação no Afeganistão também foram brilhantes alunos do professor Malley. E, à medida que tomamos conhecimento do quanto eram envolvidos e conscientes, passamos a entender suas causas e motivos. Muitos mais nobres, ideológicos, profundos e complexos que uma demonstração de fidelidade e apoio ao governo Bush. E, desta forma, passamos também a compreender a citação do soldado alemão sobre o exército britânico na 1a Guerra Mundial que também justifica o nome do filme: “Trata-se de um exército de leões comandados por cordeiros”.

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