quinta-feira, 1 de novembro de 2012


Um divã para dois (2012)

Branca Machado, 18/10/2012
                

        “Um divã para dois” começa onde as comédias românticas nunca chegam: 31 anos de casamento. Ele não enfeita, nem idealiza a relação; algo raro em filmes americanos neste estilo. O que vemos chega a incomodar de tão verdadeiro. E é bem mais comum do que se gostaria. Na cena inicial, Kay ( Meryl Streep) está de camisola azul e entra no quarto de Arnold (Tommy Lee Jones), seu marido, que, assustado, questiona: “ O que? O que foi?”. Ela responde timidamente: “Pensei em dormir aqui hoje... “Ele rebate: “Por quê? O ar condicionado está com defeito?”. A cena é uma ótima síntese do que será tratado no filme. 
        Kay está disposta a mudar seu casamento. Não pretende mais viver daquele jeito. E, para isso, encontra uma terapia de casal intensiva em Maine. Quando ela sugere a viagem  ao marido, salienta que nunca havia lhe pedido nada. Ele rebate: “ E aquele geladeira nova que eu comprei?”. Ela olha descrente: “Não foi isso que eu quis dizer.” Na discussão sobre ir ou não ir ou sobre se o casamento está em crise, ele afirma: “Eu beijo você todos os dias”. Ela olha daquele jeito novamente. Um olhar desanimado. Este olhar de Meryl Streep nos diz tudo sobre a personagem. Ela quer dizer tanta coisa, mas, simplesmente não diz. É um olhar de quem precisa falar, mas não sabe como. 
        O filme possui pequenas sutilezas que colaboram com o discurso. O hotel econômico e frio em que eles se hospedam contrasta com as pousadas pitorescas da cidade, bem mais apropriadas para um casal de férias. Na primeira sessão de terapia, eles sentam no sofá cada um no extremo oposto do outro. Dependendo da situação, sentam-se mais próximos, depois, afastam-se novamente. Ela abotoa a blusa  numa situação que a deixa particularmente desconfortável. Não por acaso, no quarto do hotel, enquanto conversam, a televisão exibe “Mad about you”,  uma série que tem como tema principal as neuroses e confusões de um casal recentemente casado. 
        Para o terapeuta (Steve Carell), Arnold responde que seu casamento é bom o suficiente, já Kay afirma que quer um casamento novamente: “Ele costumava me tocar. No braço. No ombro. Não apenas para aquilo, mas por que ele queria...” Nessas sessões, o diretor costuma deixar a câmera em um, enquanto o outro fala, mostrando a reação de quem ouve e não a atitude de quem fala. A ênfase é no  efeito da revelação. Eles sabem pouco um do outro atualmente. Não se ouvem e não se olham mais. Em uma discussão, durante a viagem, Arnold  pergunta à esposa: “Alguma vez eu disse alguma palavra grosseira para você?”.  Ele não percebe mais quando está sendo grosseiro. É este tipo de coisa que o casal vai descobrir ao longo daquela semana. 
        Acompanhamos a terapia e sabemos o quanto está sendo difícil para eles. Expor-se daquela forma requer coragem. Quando voltam para casa, Arnold diz para Kay: “ São só expectativas. Como quando você muda a cor  do cabelo ou a roupa. Você muda  por um momento, mas, no final, você volta a ser você mesmo.” Sim. A gente volta a ser a gente mesmo. Mas todos  queremos mais e não  paramos de querer só por que nos acostumamos. Talvez, essa estagnação é que não faça parte da nossa natureza. Como afirma Kay “Deve haver sempre algo para almejarmos no futuro". 

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