“O Último Azul” se passa em um Brasil distópico no qual pessoas com mais de 75anos devem ser retiradas da sociedade e recolhidas a uma colônia de idosos. A história lembra obras como 1984 de George Orwell, incluindo aspectos como a vigilância constante, a supressão da liberdade individual e do pensamento crítico.
Trata-se de uma atmosfera opressiva e imaginária, mas que, em alguns momentos, não nos parece tão improvável quanto deveria. No filme, acompanhamos Tereza (Denise Weinberg), uma mulher de 77 anos, que descobre que não pode mais se deslocar sem a autorização da filha e que tem poucos dias para se mudar para a colônia.
Tereza é resistência. Ela não quer ir. Não vê motivo. Não queria também parar de trabalhar, mas teve... Em sua saga marginal para escapar desta sina legal, ela cruza com diversos personagens como o barqueiro Cadu (Rodrigo Santoro) ou Roberta (Miriam Socarrás), como a navegante que comprou sua liberdade. Cada personagem é uma possibilidade. Toda a travessia acontece pelos rios amazônicos, um cenário que é também personagem.
Dirigido por Gabriel Mascaro, o filme conquistou destaque internacional: foi premiado com o Urso de Prata no Festival de Berlim e teve o reconhecimento do público com o Prêmio do Júri de Leitores do jornal Berliner Morgenpost. Segundo o diretor, “o filme é um manifesto poético sobre o direito de sonhar — independentemente da idade — e sobre a possibilidade de ressignificar a vida a qualquer momento”.
O personagem castrador, além do estado, é a filha que a todo momento impede a mãe de seguir com o que quer. Ela, por lei, é quem toma as decisões desde que Tereza completou 75 anos e até recebe uma compensação financeira por isto. Esta inversão é cada vez mais pertinente. O outsider é o idoso; o repressor, o filho. Segundo Angelo Cordeiro da revista Rolling Stone, “O Último Azul é coming of age da terceira idade em uma Amazônia distópica e fabular: Em vez da adolescência, é a velhice que ganha contornos de aprendizado, desejo e transformação. Tereza, com sua força silenciosa, enfrenta desafios que a obrigam a rever sua relação com o mundo e com o próprio corpo”.
Hoje, com assuntos como o etarismo e o aumento da longevidade em alta, o filme traz uma reflexão válida e atual. E a lição que nos deixa é que idade não é sentença. A vida sempre terá possibilidades para quem tem disposição e sonhos a realizar.