segunda-feira, 31 de março de 2025

Anora

 




Anora foi o vencedor do Oscar 2025. Além do prêmio de melhor filme, levou mais quatro: roteiro original, montagem, direção e atriz. Ele ainda venceu a Palma de Ouro do Festival de Cannes. Claro, não foi à toa. Mas também não é tão simples entender o motivo para este sucesso. Tem quem tenha adorado; tem que tenha achado bastante injusto. Indiferente, ninguém ficou.

O filme narra a história de Anora (Mikey Madison), uma dançarina erótica que conhece o herdeiro de um oligarca russo, casa-se com ele e, em seguida, é perseguida e coagida a anular o casamento.

O diretor Sean Baker realiza uma mescla de estilos cinematográficos de forma eficiente e faz com que a gente pense estar acompanhando uma história e, de repente, estamos em outra. No começo, ficamos inquietos e até incomodados com a forma eufórica e alucinante com que a história se passa. Sexo, drogas e até amigos são prazeres tão fugazes que, nem durante o “consumo”, parece haver total satisfação. Há no olhar e nos movimentos daqueles personagens uma falta de foco e uma certa aleatoriedade que não soam divertidos.

A história chega a parecer romântica com a decisão do herdeiro russo de se casar com a prostituta. Mas esta impressão também é fugaz. Logo em seguida, o filme torna-se  um thriller intenso de busca com planos sequências e personagens que nos lembram gangsters. Alguns, até cômicos. É neste ponto que surge o capanga armênio Igor (Yura Borisov) que passa a ser interesse da câmera. Ele é o único que enxerga a protagonista de uma forma mais humana, talvez, por entender, como afirma a crítica cinematográfica Isabela Boscov, que ambos estão na parte mais baixa daquela pirâmide social.

Podem lutar, gritar (e como Anora grita!) que, ali, não têm a menor chance. Ela tenta. Ele, nem isto. Resignado, tem um olhar de compreensão que a gente só percebe porque o diretor nos guia para ele. O filme é, portanto, um exercício cinematográfico bastante interessante. Mas, talvez, por isto, deixou de nos envolver de forma a torcermos verdadeiramente pelos personagens.  A cena final precisa desta conexão para ser absorvida em sua totalidade. Sem ela, causa estranhamento. Mas é bom ver Anora chorar. Ela estava precisando. 

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Conclave

Conclave, dirigido por Edward Berger, recebeu 8 indicações ao Oscar 2025, entre elas, melhor filme, melhor ator (para Ralph Fiennes) e melhor roteiro adaptado. Baseado no livro de mesmo nome, do autor Robert Harris, sua trama se passa no Vaticano durante um conclave papal agitado por mistérios, intrigas e suspense.

A história começa com a morte repentina do Papa e com o Cardeal Lawrence (Fiennes) sendo indicado para gerenciar o conclave de escolha do novo Pontífice. A partir daí, o filme se passa durante o processo ultrassecreto e ritualístico da escolha do novo Papa e apenas nas dependências onde ele acontece. Vemos e convivemos com os ambientes que os cardeais votantes frequentam. A palavra “conclave” A palavra “conclave” pode ser traduzida como um lugar que pode ser fechado por chave e é assim que estamos, juntamente com os cardeais, e sentimos, como eles, que aquela escolha não vai ser fácil.

São 108 participantes e é preciso obter 2/3 dos votos. Não há candidatos. Todos ali podem ser escolhidos. Mas existem tendências opostas: Tedesco (Sergio Castellitto); o cardeal ultraconservador de Veneza; Bellini (Stanley Tucci); progressista, defensor, por exemplo, de direito das mulheres dentro do Vaticano; e alguns azarões como Benítez (Carlos Diehz), que defende que “A igreja não é passado. É o que faremos a seguir”.

Mentiras, acontecimentos passados e dúvidas permeiam a escolha e o andamento do processo; o que nos prende à trama e nos remete às eleições políticas. Fotografia e trilha sonora reforçam toda esta tensão e ajudam a envolver o espectador.

Alguns irão se surpreender com o final, mas, para mim, a decisão do Decano foi coerente com seu personagem. Afinal, em seu discurso de abertura, Lawrence declarou: “Nossa fé é uma coisa viva. Precisamente porque anda de mãos dadas com a dúvida. Se houvesse apenas certeza e nenhuma dúvida, não haveria mistério. E, portanto, nenhuma necessidade de fé.” Escolhendo, assim, o “talvez” do Cardeal Benítez “Talvez seja a minha diferença que me tornará mais útil”.